Quando se fala atualmente em clubes brasileiros de futebol, o assunto que vem ganhando a atenção do mercado não envolve somente a performance dos times em campo — quem ganha, quem perde, quem é rebaixado ou leva a taça. Hoje essas instituições vivem um novo momento, voltado para a profissionalização de seus negócios, com foco em tornar a atividade esportiva algo rentável.

Essa realidade de busca pela profissionalização também faz parte da vida das PMEs – pequenas e médias empresas atualmente. As exigências do mercado por empresas que sejam transparentes com seus stakeholders, saudáveis financeiramente, que ofereçam produtos e serviços que não beneficiem somente o próprio bolso, mas a sociedade como um todo, e que atuem com propósito são apenas algumas das condições que devem ditar a sobrevivência das PMEs daqui em diante.

Voltando ao exemplo dos clubes de futebol. Nos últimos meses, nomes como Botafogo, Atlético, Flamengo e Palmeiras conseguiram demonstrar em campo o resultado dessa profissionalização. O time alviverde elegeu uma presidente com grande experiência no mercado corporativo — Leila Pereira é dona da Crefisa, uma das patrocinadoras do Palmeiras, que chegou no fim do ano passado promovendo uma série de mudanças visando a reestruturação do clube, incluindo a redução das dívidas, corte de custos e adequação no elenco de jogadores.
Já o Botafogo, que também vivia um momento delicado, ao ser rebaixado para a série B e acumulando dívidas na ordem de R$1,3 bilhões — também optou por trazer um executivo de fora. Para escolher o profissional que estivesse alinhado a essa missão de reerguer o clube, o alvinegro optou por contratar uma empresa de seleção de executivos.
Gestão familiar
O Brasil tem grande parte das PMEs com gestão familiar. De acordo com dados do Sebrae e do IBGE, os números apontam que as empresas familiares são responsáveis por mais de 60% do PIB e 75% dos empregos no país.

Esse perfil de gestão muitas vezes acaba sendo um empecilho para essas companhias conseguirem alçar voos maiores. E trazer um profissional de fora, com uma visão de mercado, contribui para esse caminho. No caso do Botafogo, com a ajuda da EXEC – maior consultoria brasileira na seleção e desenvolvimento de executivos e conselheiros – o clube está sob o comando do presidente executivo Jorge Braga desde o fim do ano passado. Na mala, ele traz experiências vivenciadas em grandes corporações como a Claro e a Serasa.
Enquanto Braga cuida da parte operacional e tem a missão de reerguer as finanças e a saúde do time — que já conseguiu voltar para a série A — Durcésio Mello ocupa a cadeira de presidente eleito e está à frente do trabalho mais institucional do clube. “Sócios e conselheiros vitalícios tinham poder sobre os times de futebol e a política interna acabava incentivando a chegada de presidentes pouco preparados para a gestão de uma máquina que movimenta somas estratosféricas”, afirma Lúcio Daniel, sócio da EXEC que liderou o processo de seleção de Braga.
Trazendo esse exemplo para a realidade das PMEs, é bastante comum encontrar empresas regidas por famílias que estão enfrentando dificuldades financeiras e de atuação, porém, que não conseguem abrir mão de sua influência na companhia para entregá-la nas mãos de profissionais que não tem ligação emocional com o negócio e podem encontrar novas soluções.

Para o sócio da EXEC, fazer essa transição não é um processo fácil. “Os clubes precisam abdicar da influência da política, algo que é centenário e transformar a gestão em um ambiente mais profissional. É um processo doloroso, mas podemos mostrar que com a experiência do Botafogo e de alguns clubes de fora o que se tem a ganhar com essa transformação”.

Governança corporativa
A chegada de um profissional com uma nova mentalidade estimula o desenvolvimento da governança corporativa nas empresas — no caso dos clubes, até então era regido pelos interesses dos sócios. No caso das empresas familiares, pelo pai, mãe, tio ou filhos que estão à frente do negócio.

Porém, segundo a 4ª edição da pesquisa Retratos de Família: um panorama das práticas de governança corporativa e perspectivas das empresas familiares brasileiras, produzida pelo ACI Institute e Board Leadership da KPMG no Brasil, os empreendimentos familiares brasileiros seguem desenvolvendo de forma acelerada suas estruturas e práticas de governança corporativa.
“Hoje os clubes estão ganhando os campeonatos, equilibrando as contas, trabalhando a comunicação da marca de forma transparente com os torcedores. O Brasil ainda está engatinhando nesse movimento, porém, ainda há muito a ser feito”, enfatiza Lúcio Daniel, trazendo a questão da governança para os clubes.
Conselho independente
Após a contratação do novo presidente executivo, o Botafogo também instaurou um conselho independente, que passou a contar somente com executivos de fora, sem maioria de sócios. A partir de então tem a contribuição de profissionais de diversos segmentos do mercado que trazem novas ideias e ajudam a definir outros rumos.

O sócio da EXEC aponta ganhos importantes com essa atitude. “Isso é positivo porque o investidor de fora fica mais confortável em pisar nesse terreno para investir, pois as informações são transparentes, a gestão está profissionalizada e não tem mais intervenção dos ‘donos’. A gestão está profissionalizada e não tem mais intervenção política. Esse é o primeiro passo para a estruturação da governança, que vai ser cada vez mais uma condição de sobrevivência para o futuro”, conclui.